março 17, 2011

saídos dos quadros de Hooper

Na praça de alimentação do shopping. A biblioteca fecha às seis e vim pra cá pra terminar o trabalho que tenho de entregar amanhã de manhã sem falta. Acabo por escolher uma mesa que depois não me serve: a tarde cai e o candeeiro, justamente este aqui, está avariado, a luz intermitente que só percebi depois de já bem instalada: óculos, lapiseira, borracha, a bolsa na cadeira mais próxima, o saco do supermercado com compras - e as provas do livro. Transfiro tudo para outra mesa.
Faltam três páginas ou pouco mais. Olho à volta. O céu já praticamente escuro. Só a luz dos candeeiros, daqueles que ainda funcionam. Música de shopping, ruído apenas, mas que não incomoda porque o livro é ótimo e fico totalmente colada ao texto.
Última página. Acabou. É bom mas é pena, o livro é mesmo ótimo, ainda esticava um pouco mais o trabalho só por prazer de ler isto.
De novo, observo em volta. Poucas pessoas dispersas em cadeiras de cores pálidas. Cabeças baixas, olhar sem direção definida, ou então pregado na tv suspensa. Me faz pensar em Portugal, no porquê de eu ter vindo pra cá, e de estar aqui, hoje, a contar os tostões como quase toda a gente.
Já é noite. Só a luz dos candeeiros refletida nos rostos, mas são todos pálidos, como as cadeiras. Parece um quadro de Hooper. Todos saídos dos quadros de Hooper. Eu também.

2 comentários:

  1. como sempre, Ana, os teus textos têm uma precisão impressionante. e comovente. realmente, é tempo de perguntarmos todos a razão de aqui estarmos. quando há trópicos (ainda que tristes)a chamarem por nós.

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  2. ... mas no fundo eu sei: vir e ficar foram escolhas da natureza do afeto, e por isso acertadas. Não há respostas "razoáveis".

    E você disse bem: os trópicos são tristes sim, mesmo sem parecer à primeira vista...

    bj, querido.

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