junho 11, 2014

os maiores segredos

Meu email parece uma lixeira. Agora todos os dias recebo inúmeras mensagens "personalizadas" me chamando pelo primeiro nome, como se fossem íntimos, do Joaquim, do Lucas, da Marlene, do Francisco, e mais uma variedade de nomes, me oferecendo mundos e fundos. Mundos e fundos que eu não quero. Até a felicidade! (Essa eu quero mas não assim, vendida.) Um "fantástico leitor MP5 multimedia", a tal "Felicidade prometida pra você", o "Segredo do sucesso" e mais o que houver. Isso sem falar nas burlas travestidas de mensagens de alerta da "Receita Federal", da "Polícia Federal" (ilustrada com o escudo da dita cuja), da "Direção do Banco", todos referindo os meus "crimes" que estão por pagar. É claro que o que eles querem mesmo é ver a minha máquina cheia de vírus e spywares pra poderem bisbilhotar os meus segredos. Mas isso não deixo não. Até porque os meus maiores segredos estão muito bem guardados.

esplendor

 Mariola Landowska

Estou sentada à varanda, nas mãos um belo livro que me comove, que por isso quase beijo, e de repente olho o dia e as cores explodem sob o sol, a luz, o céu muito azul sem nuvens, as árvores já plenamente recuperadas do tempo frio exibem um verdor que nunca vi, por onde até mesmo a mínima flor surge com o máximo do seu colorido e de vida. Cantam todos os pássaros e essa é a vantagem da calma e da paz do lugar, ouvir todos os pássaros. Estou sentada à varanda com um belo livro já prestes a acabar e sei bem do esplendor desse momento que aqui não consigo reproduzir.

maio 21, 2014

são essas coisas que valem


Acabei de conhecer o senhor Manuel, que veio aqui em casa tirar as medidas pra substituir a porta da varanda e os estores. Me lembrou tanto os portugueses imigrantes que conheci no Rio faz tempo... há uns cinquenta anos... Continuando: ficou curioso sobre a minha origem, perguntou de que estado do Brasil eu era, e me contou então que viveu cinco anos com uma senhora brasileira de Goiânia, separada, e cujos filhos tinham ficado no Brasil. Ora, eles fizeram um empréstimo para que ela fosse ao Brasil buscar os filhos. Só que: o ex-marido disse que só permitia que os filhos viessem se ele viesse junto. Vieram todos. E o senhor Manuel teve que aceitar. Perdeu a companheira com quem era feliz, ajudou-a a fazer a mudança pra casa onde ela passaria a viver com o ex e os dois filhos, e agora são apenas amigos, e amigos que se ajudam. Mas ele me contou isso com uma expressão no rosto e nos olhos que me tocou muito: não é comum encontrarmos pessoas com tal capacidade pra viver bem a vida.

abril 04, 2014

fazer a própria massa

©Analu Prestes

Sempre tinha sido assim. Há muito esperava que o futuro trouxesse a chave para a sua própria charada (houve tempos em que sim, que teve quase a certeza de ter à mão todas as respostas, mas depois... não... ainda não); uma questão de tempo e paciência, capacidade de espera — o que decididamente não tinha. E tudo isso desembocava ora em turbilhão, ora em passividade expectante. Não era possível que toda aquela vida que projetara não passasse de um clichê e mais nada.

Agora lembrava-se desse tempo: ah se então tivesse sabido — (...)
Porque depois houve, sim, todos aqueles anos — enfim! Os tempos por que tanto ansiara. Foram dias de promessa, sem dúvida; e de grande risco, mas um risco menor diante da sua certeza que vinha não sabia de onde: os dias chegaram, os dias por que esperara quase uma eternidade.

O que resultaria de tudo aquilo, (...) não o sabia nem pensava nisso. Sentia que todas as suas forças até então dissipadas e dispersas se reuniam numa única força, e com uma terrível energia se orientavam para um objetivo ditoso.

Mas. Soube então que tinha direito a uma fração, apenas; desta única fração teria de criar a substância toda. Viveria sob um novo enigma, e com este teria de buscar o sentido. Fazer a massa de si própria.

março 04, 2014

Para ti

Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo

Mal de te amar neste lugar de imperfeição

Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e nos separa.

Que nenhuma estrela queime o teu perfil
Que nenhum deus se lembre do teu nome
Que nem o vento passe onde tu passas.

Para ti eu criarei um dia puro
Livre como o vento e repetido
 

Como o florir das ondas ordenadas.



Sophia de Mello Breyner, Antologia Poética


janeiro 16, 2014

entre esperas e pausas

Faz hoje uma semana que voltei. O tempo voa, mas eu não: uma semana inteira pra pôr a casa de novo em funcionamento - e a minha cabeça também. Preciso dessa lentidão, embora a vida prática me peça a pressa que não tenho.
Logo que cheguei percorri as ruas desta 'aldeia' e me fiz presente antes que elas me esquecessem de vez. Agora aguardo um trabalho que está pra chegar, enquanto avanço com outro; espero pelo encontro com uma amiga em Lisboa; há providências diversas que me exigem ação.
Anseio por uma manhã de sol que vem-não vem. Mas J. virá, com certeza.
Entre esperas e pausas, fica o registro desses primeiros dias.